"Que me desculpe o Michaelis, mas no universo do
amor, as palavras ganham significados diferentes. Achamos as definições já
existentes muito simplistas e resolvemos recriar algumas definições segundo o
universo dos apaixonados. Eis algumas delas:
“Acordar” deixa de ser o penoso verbo
intransitivo que quer dizer “recobrar os sentidos, voltar a si”, e ganha uma
motivação a mais. Quem ama, logo que abre os olhos, acaba pensando no outro, e
sair da cama fica mais fácil – seja porque hoje é dia de vê-lo ou apenas porque
mandar um SMS de bom-dia-eu-te-amo dá mais energia do que um gole de café
preto.
“Beijar” perde o monótono sentido de “ato de
chegar os lábios a alguém ou a alguma coisa” e se transforma numa das melhores
coisas da vida. Quem ama não só beija: penetra na alma do outro.
“Conchinha” também ganha significado novo – deixa
de ser o ”invólucro duro e calcário, quase sempre cônico, de certos animais,
especialmente dos moluscos” e passa a ser uma das coisas mais aconchegantes que
existe. Quando Deus fez nossos corpos, ele os calculou certinho para que se
encaixassem na posição preferida dos apaixonados.
“Doar”, que no significado comum é ”transmitir
gratuitamente a outrem bem, quantia ou objeto que constituía propriedade”, ganha
muito mais sensibilidade. Talvez os apaixonados sejam os que fazem essa ação com
mais maestria, porque se doam de corpo de alma, se doam por inteiro. Doar, na
realidade dos amantes, ganha uma freqüência exemplar, principalmente quando
estamos falando de seres naturalmente egoístas como os humanos.
O verbo transitivo direto “elogiar”, que antes
tinha a monótona definição de ”aplaudir, gabar, louvar”, no dicionário amoroso
ganha definição de: “alimento mais poderoso no quesito manter relações longas e
felizes; alimento pra alma.”
“Foder” que pro Michaelis é “prejudicar”, ganha
sentido oposto: que ama não transa apenas, fode. Porque foder é muito mais do
que penetrar o corpo; fode-se quando a vontade de entrar no outro é tão grande
que ultrapassa os limites físicos. Fode-se quando se deixa o corpo extravasar
toda aquela vontade reprimida do lado de dentro.
“Gostar”, que tradicionalmente tem o significado
de “achar bom ou belo”, deixou de existir e se perdeu em meio a imensidão dos
sentimentos dos amantes. Gostar é pouco demais, sóbrio demais, singelo demais.
Por desuso, a palavra foi substituída pra sempre por amar.
“Hoje”, que em teoria é “no dia em que estamos,
no dia corrente”, ganha novo significado de “o bem mais precioso que se tem”.
Porque os amantes lúcidos sabem que o ontem já foi e que o futuro ninguém sabe,
já que as pessoas não nos pertencem, apenas permanecem enquanto estão felizes
naquele lugar. Quem ama vive o hoje com todas as forças.
“Intenso”, antes conhecido como algo “em que há
muita tensão”, perde totalmente o sentido pejorativo e passa a ser adjetivo que
antecede todos os substantivos no amor.
“Jurar”, palavra tão usada no dicionário comum do
dia a dia, ficou obsoleta e caiu em desuso no dicionário dos apaixonados
conscientes. Quem sabe da fragilidade da vida não faz juras de amor, e sim
demonstra diariamente o sentimento com ações.
“Lindo”, que para alguns é algo modesto como
“aprazível, agradável”, perde o papel de coadjuvante e ganha muito mais espaço
nessa nova versão da Língua Portuguesa. Lindo vira radiante, esplendoroso, digno
de aplauso. E tudo, pra quem ama, ganha esse adjetivo na frente, inclusive a
vida, que, definitivamente, fica linda quando a gente se apaixona.
“Mentira”, que é conhecida por “afirmação
contraditória à verdade”, ganha novo significado de “punhalada nas costas.” Pra
quem ama, saber que aquela pessoa que escolheu dentre todas as outras do mundo
lhe enganou dói mais do que ferida aberta com tatuagem.
“Nariz” deixa de ser “parte saliente do rosto
entre a testa e a boca” e passa a ser “aquela parte do corpo do outro na qual a
gente tem vontade de beijar a pontinha quando o amor transborda.”
“Olhar” deixa de significar “fixar os olhos em” e
ganha definição de “compulsão dos apaixonados.” Quem ama quer o outro sempre
perto dos olhos.
“Pegar” não é mais “segurar, prender com a mão”,
e sim “agarrar com vontade e nunca mais querer soltar.”
“Querer” não é mais “ter a intenção de”. O querer
é o sentimento que motiva cada passo e que contamina todas as horas do dia.
“Raiva” que no dicionário real era “aversão,
ódio” também caiu em desuso e deixou de existir na versão amorosa do dicionário.
O sentimento do amor é tão forte e poderoso que anula o poder da raiva. Onde
existe luz, não pode haver escuridão.
“Saudade”, que para os meros mortais era
“recordação nostálgica e suave de pessoas ou coisas distantes”, ganha nova
definição de “sentimento dramático que esmaga o peito e que só passa quando o
outro chega.”
“Tristeza”, é muito mais do que somente “falta de
alegria ou contentamento.” Tristeza é aquele sentimento que corta o peito como
facão afiado, é o clamar do coração que demonstra estar doente. Tristeza é o
oposto do amor.
“Urgência”, em vez de “pressa”, vira aquele
sentimento forte que assola os corações dos apaixonados quando estão longe um do
outro. Urgência é a fome do coração.
“Verdade”, que antes era “realidade e exatidão”,
ganha significado de “base, estrutura”. Sem ela, o edifício do amor desaba.
Os gramáticos e estudiosos da Língua Portuguesa
que nos desculpem a audácia de criar novas definições baseadas na nossa
experiência de ter o coração aquecido pelo sentimento mais poderoso do mundo –
mas é que pra gente, a vida deixa de ser monótona e ganha um novo sentido."
*definições tradicionais das palavras foram
consultadas no Dicionário de Português Online Michaelis.
By casal sem vergonha